A Superintendência Regional do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) informou que é possível levar água do Rio Amazonas - um dos maiores do mundo - para São Paulo e outros estados que sofrem com falta d'água no Brasil. Especialista diz que 1% da vazão do rio que banha o Pará e Amazonas daria para abastecer Nordeste e Sudeste do país. O órgão defende que os tipos de obra e intervenção merecem amplo debate. A proposta sugerida pelo governador do Amazonas, José Melo (PROS), nesta semana, gerou polêmica e também foi alvo de críticas em redes sociais.
Os grandes rios estão longe das grandes concentrações populacionais do país. Os problemas com abastecimento de água poderiam ser solucionados com obras que levassem água do Rio Amazonas para as regiões afetadas, de acordo com o superintendente regional do CPRM, Marco Antônio Oliveira.
"Claro que é um assunto bastante polêmico, envolve questões ambientais. Tem uma reação muito grande de quem é contra, mas acho que temos que debater esse tema porque a Bacia Amazônia concentra mais de 90% da água doce do Brasil, sendo que aqui a população não representa 10% da população total brasileira.
Enquanto as regiões Sudeste e Nordeste concentram quase 80% da população e tem uma disponibilidade hídrica de menos de 15%, ou seja, há um desequilíbrio entre a oferta de água e a demanda. Temos que olhar esse aspecto com muita seriedade, porque energia tem solução, mas não tem solução para fabricar água. É preciso deslocar água para onde falta", justificou o representante do órgão que monitora dados geológicos e hidrológicos do país.
O Rio Amazonas joga no Oceano Atlântico em torno de 200 mil metros cúbicos por segundo. Um metro cúbico corresponde a mil litros de água, então em média, são 200 milhões de litros de água doce que o rio despeja no Oceano Atlântico.
Na época de cheia esse volume pode ultrapassar 600 mil metros cúbicos por segundo, conforme dados do CPRM. Marco Antônio Oliveira explicou que 1% do volume da vazão poderia abastecer São Paulo e o Nordeste.
"Para São Paulo, o que falta no Sistema Cantareira são 30 metros cúbicos por segundo, ou seja, o Amazonas dispõe de uma vazão mil vezes o que necessita em São Paulo e no Nordeste. Se fizesse um desvio de água de 1% desses 200 mil m³, para o Rio Amazonas não seria nada, um desvio insignificante, mas que representa quase toda a vazão do Rio São Francisco", afirmou o superintendente.
Diferentemente da proposta do governador do Amazonas, que sugeriu a transferência da água na Foz, Oliveira sugere que a captação das águas poderiam ser feita no trecho do Rio Amazonas que banha o Pará. Para o Nordeste, seriam necessários percorrer cerca de 2 mil km e para o Sudeste 4 mil km.
"Com projeto bem planejado poderia ser possível sim levar água para essas regiões. Seria projeto pioneiro, não tem similar no mundo, talvez o da China que está fazendo uma transposição do Himalaia para Região Norte do país. A questão de vender a água é um mercado que não existe, vai ser criado. Temos condições naturais de fornecer água para o Brasil inteiro, não é uma retirada como essa que vai afetar a disponibilidade hídrica da região Norte. Aqui temos água na atmosfera, nos rios e no subsolo. Agora qual vai ser a obra e o tipo de intervenção vai ser feita são assuntos tem que ser debatidos. Provavelmente terá impacto como, por exemplo, a mistura de ecossistemas, mas é um impacto que precisa ser mesurado e mitigado", ressaltou Marco Antônio Oliveira.
Proposta governo
No último dia 3, o governador José Melo sugeriu a transposição de parte das águas de um dos mais extensos rios do mundo e de maior fluxo de água por vazão: o Rio Amazonas.
"Eu sou daqueles que entende que a solução passa pelo Amazonas. Você tem o Nordeste Brasileiro com solos extremamente férteis, mas não tem água. E agora o Sudeste do Brasil padecendo da falta de água. A pergunta que deixo para o Brasil é o seguinte: por que não levar água da Foz do Amazonas, que tem em abundância, para o Sul, Sudeste e, sobretudo, para o Nordeste, onde há solos abundantes e ricos? Não precisaríamos levar água todo dia. Quando no período de chuvas resolvessem a questão do abastecimento dos reservatórios, a torneira estava fechada. Quando isso não acontecesse, o Amazonas estaria lá para socorrer", afirmou o governador.
Parlamentares divergem
A proposta foi alvo de críticas nas redes sociais e gerou polêmica em Brasília, dividindo opiniões dos parlamentares da Região Norte. A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB/AM), disse que é favorável à possibilidade, mas avaliou que o assunto precisa de amplo debate.
"Existe a possibilidade de se fazer aquedutos no sentido de se distribuir água da Região Amazônica para outras regiões do país. Agora, obviamente, que nós da Amazônia vamos querer um debate profundo, que envolva não só a questão ambiental, mas questão social e econômica também", opinou a senadora.
Já o deputado federal Édio Lopes (PMDB/RR) considerou que a questão da crise hídrica no Centro-Sul do país é uma questão momentânea e não necessita de intervenções radicais. "Ações serão desenvolvidas e em breve alcançaremos a autossuficiência hídrica na região", comentou o deputado.
Carlos Nobre, especialista em mudanças climáticas e secretário do Ministério da Ciência e Tecnologia, também disse que não é o caso de se pensar em soluções drásticas. "O Sudeste tem água suficiente de modo geral, mas é preciso uma administração mais moderna desse recurso valioso, uma gestão mais eficiente, cuidar da qualidade da água e também a recomposição da vegetação das bacias de captação de água", avaliou.