Justiça rejeita denúncia do MPF contra o major Curió
Sexta-Feira, 16 de Março de 2012 | 15:32hs | 1.675 visualizações |
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Fonte: Última Instância/UOL
Divulgação
O juiz federal João César Otoni de Matos, da 1ª Vara Federal de Marabá (PA), rejeitou no início da tarde desta sexta-feira (16/3) denúncia do MPF (Ministério Público Federal) contra o coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, conhecido como major Curió, pelo crime de sequestro qualificado contra cinco militantes capturados durante a repressão à guerrilha do Araguaia, na década de 70, até hoje desaparecidos.
O magistrado fundamentou a rejeição na Lei da Anistia, em vigor desde 1979, que anistiou os supostos autores de crimes políticos ocorridos de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, período que abrangeu a ditadura militar instaurada a partir do golpe militar de 1964.
“Pretender, depois de mais de três décadas, esquivar-se da Lei da Anistia para reabrir a discussão sobre crimes praticados no período da ditadura militar é equívoco que, além de desprovido de suporte legal, desconsidera as circunstâncias históricas que, num grande esforço de reconciliação nacional, levaram à sua edição”, diz o juiz João César Matos.
Na denúncia, o MPF relata que cinco pessoas - Maria Célia Corrêa (Rosinha), Hélio Luiz Navarro Magalhães (Edinho), Daniel Ribeiro Callado (Doca), Antônio de Pádua Costa (Piauí) e Telma Regina Cordeira Corrêa (Lia) - foram sequestradas por tropas comandadas pelo major Curió entre janeiro e setembro de 1974 e, após levados às bases militares coordenadas por ele e submetidos a grave sofrimento físico e moral, nunca mais foram encontrados.
O juiz federal João César Matos ressalta que o MPF não fez referência, na denúncia, “a documento ou elemento concreto que pudesse, mesmo a título indiciário, fornecer algum suporte à genérica alegação de que os desaparecidos a que se refere teriam sido – e permaneceriam até hoje – seqüestrados.”
Para o magistrado, no caso objeto da denúncia do MPF, o fato de os corpos dos desaparecidos não terem sido localizados não é bastante para configurar o crime de sequestro previsto no artigo 148 do Código Penal Brasileiro.
“Aliás, dada a estrutura do tipo do sequestro, é de se questionar: sustenta o parquet [Ministério Público] que os desaparecidos, trinta e tantos anos depois, permanecem em cativeiro, sob cárcere imposto pelo denunciado? A lógica desafia a argumentação exposta na denúncia”, diz o juiz federal.
Prescrição
João César Matos acrescenta ainda que até mesmo se for admitida, por hipótese, a presença de indícios do crime de sequestro supostamente praticado pelo Major Curió, a pretensão punitiva já estaria prescrita. Ou seja, o Estado não poderia mais puni-lo. Isso porque, segundo o magistrado, “diante do contexto em que se deram os fatos e da extrema probabilidade de morte dos desaparecidos, haveria mesmo de se presumir a ocorrência desse evento morte.”
Além disso, ressalta o juiz federal, “os desaparecidos mencionados na denúncia do Ministério Público Federal foram oficialmente reconhecidos como mortos pelo artigo 1º da Lei nº 9.140, de 04.12.1995, data que seria, então, o termo inicial do prazo prescricional relativamente ao delito do artigo 148 do CP [sequestro], cuja pena máxima, na forma do seu parágrafo 1º, é de oito anos”.
João César Otoni de Matos também rebateu os argumentos segundo os quais o julgamento proferido pelo Corte Internacional dos Direitos Humanos teria a força para afastar a aplicação da Lei de Anistia em casos como os relatados na denúncia oferecida contra o Major Curió.
O magistrado sustentou que a Lei da Anistia “operou, para situações concretas e específicas, efeitos imediatos e voltados para o passado”. Referiu-se ainda a entendimento do ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal) Eros Grau, para quem a Lei da Anistia “tratou de uma lei-medida, não de uma regra genérica e abstrata para o futuro”.
Desse modo, afirma o magistrado, não poderia mesmo um julgamento posterior, como o da Corte Internacional dos Direitos Humanos, “fundado em convenção internacional, pretender retroagir mais de 30 anos para desfazer os efeitos produzidos e exauridos na esfera penal pelo mencionado ato normativo”.