Um teste simples, rápido e barato de infecção por hanseníase consegue diagnosticar a doença a tempo de ser tratada, mesmo em países pobres e vilarejos remotos. Pesquisadores brasileiros e americanos desenvolveram o teste a partir da proteína LID NDO, a Anvisa o registrou no mês passado, e os primeiros exames devem ser aplicados no país ainda este ano, em dois estados. O novo teste dá resultado em menos de dez minutos, e procura a bactéria Mycobacterium lepraeem a partir de um furo no dedo.
- Funciona como um teste de gravidez e requer apenas uma gota de sangue - disse ao jornal “New York Times” Malcolm S. Duthie, um dos pesquisadores do Instituto de Pesquisas de Doenças Infecciosas, em Seattle.
A empresa brasileira de diagnóstico Orange Life vai produzir o teste ao preço máximo de R$ 4; havendo um volume de milhões de peças o preço pode ser reduzido para US$ 1. Numa primeira fase, o teste deve reconhecer anticorpos da hanseníase multibacilar em pacientes com ou sem sintomas. O tipo paucibacilar, mais difícil de ser diagnosticado, depende da tecnologia smartreader que a empresa desenvolveu e patenteou para smartphones, o que encarece os testes.
- Na terça-feira vou a Brasília para discutir o início dos testes, devemos começar por Maranhão, com as maiores taxas da doença, e mais um estado - conta Marco Collovati, médico italiano que dirige a Orange Life.
A empresa tem sede numa área de mil m² em Vargem Grande, no Rio, já produz o teste para dengue NS1 e tem 60% de um teste para tuberculose desenvolvido, a partir da proteína monoclonal MPT64, que reconhece o bacilo na tuberculose na tosse do paciente infectado: um coletor de ar capta a tosse e uma superfície nanotecnológica prende o bacilo. Com uma imunoflorescência no Smartreader é possível diagnosticar a doença.
- Tenho uma filha de 3 anos e quero que ela tenha a herança de um país onde todo mundo se dá bem; a igualdade social começa na saúde - diz Collovati, que há 13 anos chegou no Brasil e teve que morar no Pavãozinho. - Achei que tinha dinheiro, mas cheguei aqui e o cruzeiro tinha mudado para real, que valia mais que o dólar. Fiquei pobre e fui morar num conjugado na favela, o que mudou meus valores - diz o médico, que hoje mora no Recreio.
Relíquia presente em muitos países
Muitos consideram a doença uma relíquia do passado, mas todos os anos cerca de 250 mil pessoas são diagnosticadas com hanseníase em todo o mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde. Entre os países com mais doentes estão Brasil, Índia, Filipinas, Indonésia e Congo.
A hanseníase tem cura, e uma forma melhor de diagnóstico pode significar que um dia ela seja erradicada, segundo especialistas. Mais importante que o novo teste, no entanto, é a expectativa de diagnosticar a doença um ano antes do aparecimento dos sintomas, já que quanto mais cedo é o início do tratamento, melhores são os resultados.
A bactéria Mycobacterium leprae é transmitida apenas após contato prolongado e se espalha sob a pele nas partes mais frias do corpo, como mãos, pés, bochechas e lóbulos das orelhas. Os primeiros sinais visíveis são geralmente dormência e manchas sem cor na pele, muitas vezes confundidos com fungos, psoríase e lúpus. A vítima pode ter queimaduras frequentes ou cortes sem sentir. Após seis meses de sintomas, as lesões nos nervos se tornam permanentes. Mesmo quando um paciente fica curado — o que normalmente significa um tratamento com três tipos de antibióticos de seis meses a um ano. — ainda há um risco de ter úlceras infectadas ao longo da vida.
Historicamente a imagem da doença está associada à perda dedos das mãos e pés, porque conforma a bactéria mata os nervos, os músculos atrofiam e os dedos se torcem ganhando o aspecto de garras. Após o desuso e repetidos ferimentos, o corpo reage absorvendo o cálcio dos ossos, encolhendo os dedos.