Rabisque na agenda: em 2028, a mina de N4E, aberta em 1984, encerra as atividades; em 2032, a mina de N4W, aberta em 1994, estará exaurida; e em 2034, a mina de N5, aberta em 1998, será fechada para sempre. E onde ficam todas elas? Na Serra dos Carajás, município de Parauapebas, conhecido como “Capital do Minério”.
Parece delírio, mas a informação sobre isso é quente e consta de um dos tantos relatórios que a mineradora Vale produz, mantém a sete chaves e que virou artigo científico intitulado Exaustão das Minas de Ferro e Manganês em Parauapebas. Mineração (In) Sustentável?, apresentado durante o “IV Seminário Amazônia – Interações entre o Global e o Local. O Pensamento Social Crítico Contemporâneo”, no Campus I da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).
Um desses relatórios da Vale, de apelido 20-F, está disponível no portal da mineradora na internet, mas o encontrar não é tão fácil assim, uma vez que o site parece um labirinto. O documento de 235 páginas discrimina, na folha 70, o destino de Parauapebas, cuja base econômica é a indústria extrativa mineral – e só.
E então, o que será de Parauapebas, que não aprendeu a verticalizar sua economia ao longo dos anos e seus governantes tampouco se interessaram em fazê-lo? Parauapebas não tem, em tese, condições de sobreviver da agropecuária, tendo em vista que 86% de sua extensão territorial estão comprometidos com áreas de preservação ambiental.
Também não daria conta de viver do comércio e de serviços porque, como não tem sido incentivado e programado para tal, seu setor terciário é frágil e, diante do menor sinal de crise da Vale e de baixa na arrecadação, vai à ruína. Sempre que uma contratada da Vale “desce” da Serra dos Carajás, o comércio é o primeiro a sentir a “lapada”. A chiadeira é grande. A alternativa, desde o início, deveria ter sido desmarginalizar a produção mineral e tirar algum proveito, para além das “vantagens” oferecidas pela grande indústria capitalista.
DADO REAL
Os bens minerais são recursos finitos. Uma vez extraídos, acabam-se para sempre. Nada de crer que a mãe natureza os parirá, porque os que existem hoje – e estão sendo explorados – demoraram bilhões de anos para se formar. Por isso, é mera ilusão continuar pensando, como muitos em Parauapebas ainda pensam, que exista minério em Carajás para 400 anos. A propósito disso, primeiramente é preciso entender de que “Carajás” é falado quando se vai reportar, por exemplo, ao minério de ferro, principal commodity do sudeste paraense e da Vale.
O que, na cabeça de muitos, é apenas um discurso de conveniência político, para a mineradora Vale é algo muito claro, conhecido e territorialmente definido no universo da prospecção mineral. A noção de Carajás para os políticos é uma, para a população é alguma e para a Vale é outra, que desafia e vai além das definições dos livros de geografia, das teses de doutorado mais conceituadas e de órgãos oficiais, como o Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará (Idesp).
Desde 1967, quando importantes preciosidades minerais foram descobertas no sudeste paraense, a Vale faz levantamentos para saber o que há e, principalmente, o que é viável extrair. Ela não é boba. Essa região do Pará pela qual ela transita é denominada pela empresa de Complexo Mineral de Carajás.
Assim, no mapa de suas pretensões particulares acerca do minério de ferro, Carajás é primordialmente definido em: Serra Norte, localizada no município de Parauapebas; Serra Sul, localizada no município de Canaã dos Carajás; e Serra Leste, localizada no município de Curionópolis. Todas essas serras compõem um complexo geomineral denominado no mundo industrial de Sistema Norte. Logo, quando a Vale anuncia que o minério de “Carajás” vai acabar em tal data, é preciso ter clareza de que parte desse complexo – entre as serras citadas – ela está a falar.
No documento anual que a mineradora é obrigada a entregar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) dos Estados Unidos, por possuir ações na Bolsa de Nova Iorque, ela discrimina as perspectivas de todos os seus projetos no Brasil e detalha minuciosamente o futuro de seus empreendimentos no Pará. É uma produção bem feita e, por ser demais realista, preocupante.
O relatório que consubstancia a pesquisa acadêmica aponta, com muita lucidez, que – sem as expansões programadas para as minas de Serra Norte – todo o minério de ferro de Parauapebas se acabará até 2034.
Noutro documento igualmente extenso e que detalha as expansões previstas para Serra Norte, intitulado “Estudo Global das Ampliações do Projeto Ferro Serra Norte: Minas N4 e N5″, a Vale é categórica em deixar claro que as expansões das minas de ferro em Parauapebas poderão reduzir-lhes a vida-útil para 2027, já que a abertura de quatro novas cavas (N5S, Morro I, N4WS e Morro II) deve acelerar o processo.
No próximo texto, você verá o detalhamento produtivo de cada mina em operação atualmente, bem como entenderá por que o minério de ferro de Parauapebas vai se exaurir antes da data máxima 2034. Precisamente, em 2027.