Mais de dois terços das quase 700 toneladas de óleo confinadas nos 12 tanques do navio Haidar já foram retirados da embarcação naufragada no dia 6 de outubro no Porto de Vila do Conde. A Mammoet Salvage, empresa canadense especialista em salvatagem, contratada por seguradoras, espera concluir o serviço ainda nesta semana.
Enquanto isso, a Companhia das Docas do Pará, vinculada à Secretaria Especial de Portos, cujo ministro é o paraense Helder Barbalho, não tem a mesma diligência. Um mês e meio após o acidente, ainda não fez nada para promover a retirada, transporte e destinação final dos milhares de bois que se decompõem no fundo do Rio Pará. Não informou quem fará a remoção, como será feita e muito menos quando isso vai acontecer.
Na última terça-feira (17), o Poder Judiciário fixou o prazo de dez dias para a companhia apresentar um plano de ação para efetuar o resgate. O prazo acaba na próxima sexta-feira. O plano é a única garantia de que o trabalho será feito da maneira correta, obedecendo aos protocolos de segurança, para não provocar mais danos ou prejudicar a população de Barcarena, principal vítima dos impactos ambientais, sociais e econômicos do desastre.
A CDP também deve apresentar o plano de contingenciamento de carga viva, demonstrando o que fará para evitar novos casos como o do Haidar e como agirá se isso voltar a acontecer; um diagnóstico ambiental da região afetada pelo desastre, mencionando a amplitude dos danos; e um plano de remediação de danos causados, assumindo juntamente com as empresas infratoras as responsabilidades relativas à mitigação dos impactos e compensação de perdas.
As empresas notificadas são a Minerva Food, maior exportadora de bois vivos do Brasil e quarta maior do mundo; a Servport Serviços Marítimos Ltda, especialista na operação portuária; e a Global Agência Marítima, responsável pelo transporte dos bois no Haidar – todas elas com bens passíveis de indisponibilidade, de acordo com pedido do Ministério Público Federal.
O plano de ação e os demais registros obrigatórios têm de ser aprovados pelas autoridades ambientais. A relutância da CDP em apresentar tais documentos impede a retomada da rotina no Porto de Vila do Conde, prejudicando operadores e usuários e afetando até a economia do Estado. Sem a garantia de segurança, é impossível liberar o embarque de carga viva.
“Retirar os animais em decomposição do fundo do rio e descartá-los é uma operação delicada e inédita”, pondera o secretário de Meio Ambiente do Pará, Luiz Fernandes Rocha. “Existem protocolos de segurança que têm de ser obedecidos, para que a operação não afete a população do município”.
Para facilitar a formulação desse plano, Semas e Ibama encaminharam à Companhia das Docas os termos referenciais da operação, sublinhando os cuidados que devem ser tomados. Durante a operação, que deverá durar quatro meses, o embarque de carga viva pode ser retomado. Porém, mesmo notificada cinco vezes pela Semas, sujeita a multa de R$ 2 milhões por dia, pressionada pelo Ibama e avisada pelo Poder Judiciário, a CDP se mantém recalcitrante e não apresenta plano algum.
Semas e Ibama já se prontificaram, inclusive, a acompanhar os próximos embarques de carga viva no Porto de Vila do Conde, para fiscalizar o cumprimento de plano de contingenciamento, tão logo ele seja aprovado. “O único documento protocolado na Semas e no Ibama é evasivo. Não atende aos protocolos de segurança, ignora os termos de referência e nem garante o resultado necessário”, analisa Luiz Fernandes.
EXPORTAÇÃO
A venda de bois em pé para o exterior é o segmento que mais cresce na pecuária nacional e o Pará é líder isolado neste setor, com 96% das exportações. A exportação de boi vivo pelo Brasil começou em 2004, quando ocorreu uma epidemia de febre aftosa no Uruguai, até então o único exportador da América Latina. Quem deu a largada foi o Rio Grade do Sul, seguido por São Paulo e Minas Gerais.
O Pará entrou no negócio em 2008, beneficiado pela grande oferta de animais, já que o Estado consome apenas metade do que produz, e pela boa logística de escoamento, através do Porto de Vila do Conde, cujo acesso é facilitado pela Alça Viária.
Por isso, a proibição de operações com carga viva no Porto do Conde incomoda tanto o setor produtivo. Quanto mais a CDP, a Minerva Food, a Servport e a Global Agência Marítima demorarem a providenciar a retirada das carcaças submersas, negando-se a cumprir as normas ambientais e até as determinações da Justiça, maior será o prejuízo dos exportadores.
Alguns deles já procuraram autoridades do Maranhão, solicitando guias de transporte de animais para que os bois vivos sejam despachados para o exterior a partir do Porto de Itaqui, mas, para isso, as empresas contratadas para o embarque e transporte dos bois terão de cumprir as mesmas exigências feitas pela Semas no Pará. A primeira delas é fazer o licenciamento da operação e apresentar o plano de contingenciamento de carga viva.